Memórias juvenis da contestação à “redentora” (de como se forma uma militante revolucionária)


O texto aqui reproduzido foi-me foi enviado, via whats app, há alguma semanas pela camarada Lúcia Saldanha Caiaffo, companheira de luta sindical e política de longa data, que conheci, na condição de jovem representante de comarca, em 1992, quando ela ocupava o cargo de presidente do Sindjus-RS, escolhida na primeira eleição direta do sindicato, fundado em 1988, no ano anterior.

Desde então formou-se entre nós uma amizade, e parceria na militância política e sindical, que as décadas decorridas não arrefeceram, mantendo aceso e incrementando o entusiasmo. Embora separados por centenas de quilômetros (ela residindo no litoral catarinense e eu na região metropolitana de Porto Alegre), raros são os dias em que não trocamos alguma mensagem e (membros ambos da corrente sindical Luta e Indignação, por mim liderada, no judiciário gaúcho) e seguidamente temo-nos ombreado de forma radical e incansável na luta política e social, metendo o bedelho não somente nas questões específicas da  categoria dos servidores da justiça, mas também no combate ao fascismo circense do bolsonarismo e na luta sem quartel pela revolução profunda de nossa sociedade.

E é, com o maior prazer que publicamos, para deleite dos leitores deste blog extemporâneo e moribundo, as memórias de sua inquieta e inconformada juventude como estudante nos anos de chumbo, no Rio Grande do Sul, cujo entusiasmo os anos não arrefeceram:

Amanhecia o dia 1° de abril de 1964. Morávamos em Santa Maria RS, bem no centro da cidade. Acordamos com um barulho estranho e vimos da janela do ap., um comboio de Urutus, muitos, em fila. Tinha eu 14, quase 15 anos e sem a menor ideia do que estava acontecendo. Cursava a 4° série do Ginásio e fazia parte do Grêmio Estudantil que cuidava apenas dos direitos e das atividades sociais dos alunos.  A primeira informação que tive, foi que os milicos estavam aquartelados e nem sabia o que era isso, estava mais focada no Baile de Debutantes, que seria em outubro próximo. Muito curiosa fui procurar informações.

Uns 2 anos depois disso, já percebendo os horrores da Ditadura, comecei a militar no Movimento Estudantil da cidade.  Sempre ouvindo minha mãe dizer que eu não me ” metesse nisso”, que era perigoso, etc… Mas, como dizia ela, sorrindo: “a Lúcia não tem jeito”. E não tenho, mesmo, até hoje .

Em 66 a família foi morar em Porto Alegre. Aí sim achei meu caminho.  Fui cursar o Ensino Médio na melhor Escola Pública do RS, considerada “Modelo”, ao mesmo tempo que o Don Pedro II do Rio de Janeiro, o Colégio Júlio de Castilhos.

Excelentes Professores tive no Científico. Mas, imediatamente substituída a Direção por gente da confiança dos Ditadores.

É claro que logo entrei no Grêmio Estudantil, chamado na época de Grêmio Literário e submetido à supervisão de uma Professora de direita que inclusive assistia às Reuniões da Diretoria!!!

A Escola era mista mas não “misturada”. No turno da manhã estudavam só as meninas e à tarde os rapazes. Entretanto, nós do Grêmio, tínhamos permissão para entrar a qualquer hora.

Na porta de entrada havia um Guarda desses de Empresa, que trabalhava fardado. No espaço em baixo da escadaria, havia um Barbeiro!! Quando o tal Guarda achava que um dos alunos estava “cabeludo”, levava para cortar o cabelo!!!

Esse foi nosso primeiro embate com a Direção da Escola. Era 1968. Combinamos que as meninas permaneceriam dentro da Escola no intervalo do almoço e os rapazes chegariam antes do horário de início das aulas da tarde.  Lotamos completamente o saguão de entrada e sentamos no chão. Fizemos uma Comissão da Diretoria do Grêmio e fomos ao Diretor.

Evidente que se recusou a nos receber. Com um megafone na mão, informamos aos colegas a decisão do imbecil Diretor. Pelo prédio todo ecoaram nossos gritos. A Besta quadrada botou a cara pra fora da sua sala e voltou pra trás em um segundo, com cara de incredulidade e mudou de ideia: “Vou receber o pessoal do Grêmio”!

Enquanto isso, a galera carregou a maldita cadeira de barbeiro e deixou na Praça Piratini, que é em frente à Escola.

Depois desse fizemos vários outros protestos. Um deles A Revolta da Minissaia.

Cansei de escrever, qualquer dia  conto mais.

Amo essa Escola até hoje!”

Lúcia Saldanha Caiaffo

O último primeiro de maio de Getúlio Vargas


Desde 1940, quando, na condição de ditador, criara o salário mínimo no Brasil, garantindo, na época, uma remuneração com um mínimo de dignidade à peonada (bem diversa do miserável valor atualmente vigente), Getúlio Vargas discursava, anualmente no Dia do Trabalhador, perante a multidão de trabalhadores cariocas, no estádio do Vasco da Gama, em São Januário, na então capital da república, o Rio de Janeiro, em estreita conversa na qual lhes trazia ao conhecimento os diversos direitos legais que seu governo lhes vinha garantindo. Em 1.º de maio de 1954, em meio à violenta oposição política e militar dos lacaios do imperialismo americano (liderados pelo histérico udeno-golpista Carlos Lacerda) contra o reajuste de 100% do salário mínimo proposto por Jango como Ministro do Trabalho, pela primeira vez faria seu discurso distante do aconchego físico das massas, em transmissão radiofônica desde o Palácio Rio Negro, na cidade serrana de Petrópolis, no Estado do Rio de Janeiro.

Naquele ano, indo muito além de seus compromissos de proteção ao trabalho e garantia de condições sócio-econômicas minimamente dignas à classe trabalhadora (o que possibilitaria classificar o velho discípulo da versão castilhista do positivismo comtiano e do socialista utópico Saint-Simon, no máximo, como um social-democrata), proferiria, no final de sua fala, uma forte conclamação para que os trabalhadores se auto-organizassem, como classe consciente e majoritária, para impor seus interesses e necessidades pela via eleitoral, se constituindo eles próprios no governo da nação: “Hoje estais com o governo, amanhã sereis o governo”!

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Reproduzimos abaixo a íntegra do discurso, a partir de matéria publicada no Correio da Manhã do dia 4 de maio, páginas 16 e 10 (visto que não conseguimos acessar o exemplar da Última Hora – o jornal criado por Samuel Wainer alinhado aos ideais de Getúlio, Jango e do Partido Trabalhista Brasileiro – o antigo PTB):

“Trabalhadores do Brasil:

Neste 1.º de maio, tão grato a quem, como eu, se acostumou a ver em vossa nunca desmentida solidariedade o maior motivo de alento para continuar devotado ao serviço da Pátria e à causa da reforma social, quero estar convosco, em espírito e sentimento, participando das vossas alegrias, na data consagrada à exaltação do vosso esforço e heroísmo. Preferi dirigir-me a todos, aqui desta sala de trabalho, para vos levar, no recesso dos vossos lares, onde mais prementes se fazem sentir as vossas necessidades, ou nas concentrações de praça pública onde vos reunis agora para ouvir a minha palavra, a boa nova de que o governo vos fez justiça, atendendo aos vossos reclamos, aos vossos desejos e às vossas reivindicações.

Rememorando os sucessos e realizações destes último doze meses, posso proclamar com orgulho que o governo soube honrar a linha política que tem norteado toda a minha vida de homem público: engrandecer a Pátria e fortalecê-la economicamente, através do estímulo e do amparo ao trabalho. Foi levado adiante, sem sombra de desfalecimento, o meu desígnio supremo que visa à valorização do trabalhador brasileiro e à plena concretização da justiça social.

Quando, em 1951, assumi o governo, um dos meus primeiros atos foi determinar a revisão dos níveis do salário mínimo, fixando novos montantes, que até hoje vigoram. No correr do último ano, foram procedidos estudos a fim de promover novo reajustamento, indispensável para vos assegurar uma remuneração digna do vosso esforço e capaz de garantir a satisfação das vossas necessidades de subsistência. A rápida industrialização e as expansão econômica do país e o nível dos salários; o crescimento vertiginoso da arrecadação do imposto de renda, que subiu de 310 milhões em 1939 para 10 bilhões em 1953, mostra que o aumento da riqueza privada e o vulto das classes abastadas estão em contraste chocante com o índice dos salários.

Hoje, depois de um exame cuidadoso do assunto em todos os seus aspectos, computadas e sopesadas cifras colhidas em todo o Brasil, consultados os competentes órgãos técnicos, é com alegria e particular emoção que vos anuncio a fixação de novos níveis de salário mínimo condizentes com as vossas aspirações e destinados a vos proporcionar melhores condições de vida. Fruto de um trabalho meticuloso, amadurecido e pensado, essa medida vem assegurar a devida retribuição ao vosso denodado labor de todos os dias e, por outro lado, se enquadra perfeitamente dentro das possibilidades e dos recursos das classes patronais.

Os que vivem a apregoar, por convicção ou espírito de oposição sistemática, que o custo da vida aumentou assustadoramente devem ser os primeiros a reconhecer que a elevação dos salários é uma necessidade imposta pela atual conjuntura econômica. As publicações jornalísticas sobre o encarecimento da vida estão fornecendo preciosos subsídios aos estudos do Ministério do Trabalho para melhorar os salários profissionais dos trabalhadores da imprensa.

Para chegarmos a este feliz resultado que hoje se concretiza, muito contribuiu a ação dos sindicatos de trabalhadores de todo o País, ao reivindicar, usando dos seus direitos, uma remuneração mínima indispensável para satisfazer as suas necessidades de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte.

Nesta campanha em que estivemos juntos e em que juntos partilhamos a alegria da vitória, é justo ressaltar a participação destacada do ex-ministro do Trabalho, João Goulart, incansável amigo e defensor dos trabalhadores, que se desvelou dia e noite nos seus esforços para atendê-los, do atual ministro interino, Hugo de Faria, que soube continuar a obra do seu antecessor, e do Ministro da Fazenda, Oswaldo Aranha, que deu a valiosa colaboração da sua experiência e do seu conhecimento aprofundado dos assuntos econômicos e financeiros aos estudos para conseguir uma fórmula capaz de corresponder ao desejo dos trabalhadores.

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A par dessa providência de interesse vital para o trabalhador brasileiro foram tomadas inúmeras medidas destinadas a trazer-vos benefício imediato. Promoveu-se a Campanha de Prevenção dos Acidentes do Trabalho, acompanhada de uma série de atos inspirados no propósito de vos garantir maior conforto e segurança no labor quotidiano; prosseguiu o Governo nos seus esforços no sentido de reduzir a carência de moradia para o trabalhador e, apesar de todos os tropeços que dificultam a sua ação nesse terreno, foram feitos progressos substanciais, sendo de notar que o decreto regulamentando a cooperação técnica e financeira entre a União e os órgãos locais, para a construção de habitações populares, abriu novas perspectivas à solução de importante problema.

Já no fim do meu anterior governo era uma das minhas maiores preocupações assegurar o reajustamento e a atualização do nosso sistema de seguro social, de modo a atender as exigências do trabalhador brasileiro, nas suas múltiplas categorias de atividades. Em 1945 eu vos anunciava essa reforma, que se tornava cada dia mais indispensável. Durante a campanha eleitoral de 1950, no discurso que pronunciei nesta cidade de Petrópolis, reiterei o meu propósito de retomar os estudos do projetado Instituto dos Serviços Sociais do Brasil, aproveitando as pesquisas feitas, completando-as e adaptando-as às necessidades atuais. Um substancial progresso acaba de ser assegurado com a promulgação do Regulamento Geral dos Institutos da Previdência Social. Esse só virá trazer benefício efetivo a cerca de 3 milhões de trabalhadores e 7 milhões de dependentes, além daqueles que poderão, através de contribuição facultativa, participar das vantagens da previdência social. Ficam doravante definitivamente abolidas as diversidades de condições exigidas aos segurados dos vários institutos, que terão, a partir deste 1.º de maio, uniformizados os prazos de carência, o plano de custeio e o de vantagens e benefícios. As pensões, até agora limitadas ao máximo de pouco mais de seiscentos cruzeiros mensais e as aposentadorias restringidas a um limite que apenas ultrapassava a cifra dos mil cruzeiros por mês, de agora em diante serão proporcionais aos salários realmente percebidos, desaparecendo o injusto desequilíbrio entre o que o trabalhador recebe em atividade e o que lhe era atribuído na hora da doença ou da incapacidade física. Além da aposentadoria por velhice ou invalidez, os institutos passarão a propiciar a chamada aposentadoria ordinária, correspondendo a um justo anseio dos que desempenham atividades penosas ou insalubres e que terão assim garantido o merecido repouso aos 55 anos de idade, com remuneração, em numerosos casos, correspondente ao salário integral. Aos associados de todos os institutos será também assegurada, em virtude dos dispositivos do referido ato, a extensão do auxílio-maternidade, que, concedido aos industriários por decreto de 1952, já beneficiou mais de 150 mil famílias operárias. Por outro lado, cria o Regulamento o auxílio matrimônio a ser proporcionado às pensionistas que se casarem, atendendo-se desse modo a um dos mais relevantes objetivos da assistência social e favorecendo a defesa e a preservação da família. Esse ato, de tanta significação social, lança também as bases para a futura participação do trabalhador rural nos benefícios da previdência. Igualmente foi dado um importante passo no sentido da inclusão dos profissionais liberais e dos trabalhadores autônomos e domésticos no sistema geral de assistência. É prevista também a organização da comunidade médica da previdência social, para racionalizar e aperfeiçoar os serviços médicos assistenciais.

Por decreto de 2 de abril último, assegurei também a direta e ativa participação dos contribuintes na gestão dos institutos de aposentaria e pensões, através da eleição dos membros dos seus conselhos fiscais pelos próprios trabalhadores.

Todos esses atos serão integrados, completados e ampliados na Lei Orgânica da Previdência Social que se encontra entregue ao exame do Congresso e que assegurará a regulamentação geral e sistemática de todos os nossos serviços de amparo ao trabalhador.

Um dos aspectos mais marcantes do meu atual governo é o seu cuidado em beneficiar o trabalhador rural e conceder-lhe as garantias que a legislação social já assegura ao operário urbano. Nessa obra de valorização do homem do campo, a par do vasto programa de mecanização da agricultura, que vai sendo levado adiante e que já supera nesses três últimos anos tudo o que foi feito antes no sentido de proporcionar aos nossos lavradores instrumentos modernos e eficientes de trabalho, tenho procurado de toda a forma recompensar os nossos camponeses pela sua valiosa contribuição para o desenvolvimento econômico. Ainda se encontram na dependência da aprovação legislativa importantes projetos que encaminhei ao Congresso, destinados a imprimir maior flexibilidade às atividades financeiras rurais e a dar assistência social efetiva ao nosso trabalhador campesino. Refiro-me ao projeto criando cédula rural pignoratícia e ao que estabelece o Serviço Social Rural.

Em 5 de abril último submetido ao Congresso um importante projeto, que estende aos empregados rurais os preceitos da legislação trabalhista, com as alterações requeridas para a sua aplicação prática. Dentre as normas específicas que consigna devem ser ressaltadas a garantia de estabilidade, a instituição da Carteira do Trabalhador Rural, os dispositivos relativos à duração da jornada de trabalho; à proteção do trabalho do menor e da mulher e à filiação obrigatória, ou conforme o caso, facultativa ao Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários. A aprovação deste projeto será justa recompensa à grande classe dos trabalhadores rurais, principais responsáveis pela estabilidade e prosperidade da nossa economia, e virará atender aos seus mais justificados reclamos.

Quero ainda mencionar outro importante aspecto da assistência ao trabalhador, a realizada pelo Serviço de Alimentação da Previdência Social, que comemora hoje 15 anos de existência e que vem prestando relevantes benefícios à classe operária. De 1951 até agora o SAPS aumentou de sete para quinze milhões o seu total de fornecimento diário de refeições. Onze novos restaurantes, quatro refeitórios, cinco armazéns distribuidores foram criados. Deverá o SAPS, dentro em pouco, iniciar a distribuição nos próprios locais de trabalho de refeições preparadas pelas cozinhas centrais.

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Trabalhadores do Brasil:

Como vedes, tudo o que depende da ação do governo, no âmbito das suas faculdades constitucionais, tem sido feito para que não faltem amparo e assistência às massas trabalhadoras. Todas as medidas que dependem da aprovação legislativa tem sido propostas ao Congresso para que se convertam em lei. As promessas que vos fiz estão sendo cumpridas, como estão sendo saldados os compromissos que assumi. As dívidas que contraí com o Povo estão sendo resgatadas. Tenho realizado por vós tudo que posso e mais do que posso.

Não me perdoam os que me queriam ver insensível diante dos fracos e injusto para com os humildes. Continuo, entretanto, ao vosso lado. Mas a minha tarefa está terminando e a vossa apenas começando. O que já obtiveste ainda não é tudo. Resta ainda conquistar a plenitude dos direitos que vos são devidos e a satisfação das reivindicações impostas pelas necessidades. Tendes de prosseguir na vossa luta para que não seja malbaratado o vosso esforço comum de mais de vinte anos no sentido da reforma social, mas, ao contrário, para que esta seja consolidada e aperfeiçoada. Para isso não cabe nenhuma hesitação na escolha do caminho que se abre a vossa frente.

Não tendes armas, nem tesouros, nem contais com as influências ocultas que movem os grandes interesses. Para vencer os obstáculos e reduzir as resistências é preciso unir-vos e organizar-vos. União e organização deve ser o vosso lema.

Há um direito de que ninguém vos pode privar, o direito do voto. E pelo voto podeis não só defender os vossos interesses, como influir nos próprios destinos da Nação. Como cidadãos a vossa vontade pesará nas urnas. Como classe, podeis imprimir a vosso sufrágio a força decisória do número. Constituís a maioria. Hoje estais com o Governo. Amanhã sereis o Governo.

A satisfação dos vossos reclamos, as oportunidades de trabalho, a segurança econômica para os vossos dias de infortúnio, o amparo as vossas famílias, a educação dos vossos filhos, o reconhecimento dos vossos direitos, tudo isso está ao alcance das vossas possibilidades. Não deveis esperar que os mais afortunados se compadeçam de vós, os mais necessitados. Deveis apertar a mão da solidariedade e não estender a mão à caridade. Trabalhadores, meus amigos! Com a consciência da vossa força, com a união das vossas vontades e com a justiça da vossa causa, nada vos poderá deter”.

Petrópolis, 1.º de maio de 1954

Getúlio Vargas

Três meses e 23 dias depois, acuado pela tentativa de quartelada da oposição pró-imperialismo internacional, que assanhava-se na crise histérica formada em torno do equivocado “atentado” ao seu principal líder, Carlos Lacerda (em que acaba falecendo um oficial da aeronáutica que o acompanhava como leão de chácara, o major Vaz, gerando o pretexto para a instabilidade político-militar), Getúlio se suicida, frustrando o golpe de Estado e legando aos trabalhistas a Carta-Testamento, que se constitui na dramática denúncia da intervenção norte-americana e no programa de luta para os futuros revolucionários nacionalistas populares.

Quase dez anos após, justamente quando o movimento político e sindical dos trabalhadores brasileiros atingia níveis de consciência e mobilização próximos do chamado de seu falecido líder no primeiro de maio de 1954, a ainda incipiente, mas entusiasmada, possibilidade de reforma da sociedade, no rumo de liquidação da herança escravagista nunca afastada, seria frustrada pela realização definitiva do desejo dos lacaios das elites internacionais que nos imporiam, pelo golpe perpetrado nos primeiros dias de abril de 1964, com a deposição do então presidente da República (o ex-ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, João Goulart) não só uma ditadura formal de 21 anos. Mas o legado do Brasil da miséria, violência e analfabetismo político, em que até hoje vivemos. No qual a condição concreta de sobrevivência da grande massa que rala todo dia para produzir o luxo de uns poucos a mantém de tal forma anestesiada e abobalhada ante a profunda desgraça em que vive que é incapaz de qualquer reação consciente à sua infeliz dominação.

Ubirajara Passos

O golpe de estado dos jegues furibundos


Eu me encontrava percorrendo com a Isadora, a pé, numa caminhada de cinco quilômetros, a Estrada da Corcunda, na zona rural de Gravataí, ontem à tarde,  lá pelas quatro horas e quinze minutos, ainda em seu trecho inicial suburbano, quando uma das mais queridas e velhas amigas – colega aposentada (casualmente a mais ferrada financeiramente, eis que ocupava o cargo de auxiliar de serviços gerais na ativa e tem seu contracheque esburacado por todos os cantos pelos mais diversos empréstimos consignados) que nos áureos tempos de nossa militância junto à gestão Magali Bitencourt no Sindjus-RS me acompanhou na marcha à Brasília contra a reforma previdenciária do Luís Inácio, em novembro de 2004 – me enviou pelo whats app esta mensagem: “Acabou de dar na TV que os bolsominios invadiram o Planalto  e o supremo”. Respondi, por áudio, que era uma tentativa concreta de golpe e que para frustrá-la era necessário descer a marreta e  botar todo mundo na cadeia.

E, tendo já lido de manhã notícia, na versão digital do jornal gaúcho O Sul, sobre o cercamento da Praça dos Três Poderes, por ordem do ministro Flávio Dino, para evitar a tal manifestação, e ouvido do vizinho ermitão (daqueles de longa e branca barba, pátio que se assemelha a uma barricada e uma tropa de gatos no chalé de madeira em que habita), ao iniciar a caminhada, de que estava se dando a “quebradeira” em Brasília (que supus fosse mera figura de linguagem), prosseguimos tranquilamente a caminhada até atingir a Igreja Nossa Senhora do Carmo (típica capela construída toda em pedra de alicerce à vista), de onde retornamos por volta das seis horas da tarde.

Durante todo o trajeto ouvira o pipocar da campainha do whats app, mas não me preocupara, curtindo o passeio com a minha filha e sua cadela Patrícia. Mas já tendo passado pelo supermercado Jadan, resolvi conferir as mensagens e dei com uma dúzia delas, dos mais diversos companheiros,  no grupo de militância sindical “Luta e Indignação” (que criei com os membros da nossa frustrada chapa às eleições do Sindjus neste ano) dando conta, em detalhes, da baderna dos “terroristas  bolsonaristas radicais” (como agora os designa, num misto da linguagem da ditadura de 1964 com a intenção de agradar ao novo governo federal, a Rede Globo de Televisão) no Palácio do Planalto, sede do STF e Congresso Nacional. Ainda me encontrando a cerca de um quilômetro, a pé, de casa, mal comentei as mensagens e ainda consegui ouvir na Rádio Pampa, em sua versão on line, a :transmissão em que Lula, da prefeitura de Araraquara, no Estado de São Paulo, lia o decreto de intervenção no Distrito Federal, justificando-o, a seguir, em discurso.

bozo atrás das grades

Já na troca de mensagens iniciais com a companheira Gilmara (a colega aposentada a que me refiro), ela havia me lembrado que, quando de nossa marcha pelo Sindjus, com outras tantas entidades sindicais e movimentos populares por muito menos (um estudante que, junto com outros, havia invadido o laguinho em frente ao Congresso, havia jogado uma pedra na vidraça deste) havíamos sido corridos a cacetete pela polícia montada da Esplanada. E, a medida em lia as manifestações dos companheiros, me dava conta da bundamolice da polícia de Brasília em relação à horda fascista, chegando a conduzi-la pela mão até os prédios para, em plena conivência safada, invadi-los e  depredá-los numa fúria própria de fanáticos religiosos de seita sertaneja.

À noite, já chegado em casa, tive o prazer de assistir ao recolhimento de uns quantos ao xadrez, e posteriormente, ao Presídio do Distrito Federal, tendo ido dormir já de madrugada, a me inteirar dos detalhes da circense (mas nem por isto pouco séria) tentativa de golpe  da extrema direita brasileira, tendo agora de manhã publicado a reflexão que segue, em meu perfil no facebook, que pretende resumir meu ponto de vista a respeito do episódio:

“Foi necessário que os jumentos enfurecidos destruíssem documentos históricos e obras de arte de inestimável valor cultural, além de vandalizar mobília, rasgar documentos oficiais (inclusive o original da Constituição de 1988 e os quadros da galderia dos ex-presidentes da república) e quebrar aparato eletrônico da sede dos três poderes da república.

Mas finalmente os bolsonazistas golpistas estão sendo conduzidos ao lugar que lhes é devido e já deviam se encontrar desde que o primeiro caminhão a serviço da patronagem escravista iniciou a obstrução da primeira rodovia nacional após a eleição de 30 de outubro: A CADEIA!

A ameaça, tosca e furibunda como as atitudes de seu grande líder “mítico”, entretanto, só cessará quando a Penitenciária da Papuda tiver o privilégio de receber um ilustre hóspede, para fazer companhia a seus pupilos, condenado à pena máxima pelo genocídio em que 700 mil brasileiros foram imolados, sem a menor necessidade, nos braços do Corona: JAIR MESSIAS BOLSONARO, a versão radicalizada, ao sul do Equador, em todos os aspectos (inclusive os burlescos) do fascismo yankee trumpista, que nestes dias repete as antigas elites cubanas lambe-cu das botas estado-unidenses, fazendo cena de vítima do “comunismo”, escondido em Orlando na Flórida.

Vários deputados democratas americanos já se manifestaram, desde ontem, nas redes sociais, defendendo sua extradição ao Brasil, diante do episódio do “Capitólio Tupiniquim” perpetrado no domingo. Mas é preciso que os que mais sofreram com as consequências de seu tresloucado e arbitrário governo, os trabalhadores brasileiros, garantam nas ruas que isto se torne uma realidade, bem como o afastamento de toda e qualquer nova tentativa cretina de golpe, assim como a revogação das reformas trabalhista (realizada na gestão do golpista Temer) e previdenciária (executada no governo Bolsonaro).

Hoje às 17 h, na esquina democrática em Porto Alegre, e às 18 h, no MASP, em São Paulo, ocorrem atos públicos pela exemplar investigação e prisão dos golpistas: ÀS RUAS, CAMARADAS!”.

Ubirajara Passos

Aos militantes que se acotovelam em frente aos quartéis, agora embalados por uma representação judicial maliciosa e falaz no TSE:


Saibam que Bolsonaro não poderia nem ter sido candidato. Deveria estar preso, inclusive, em razão dos 700 mil brasileiros mortos em consequência de sua política sanitária anti-isolamento, anti-máscara e anti-vacina.

Tentou roubar a eleição mandando a polícia federal reter virtuais eleitores do adversário em pleno pleito e mesmo assim perdeu.

Não existe fraude, não existe manipulação. Por escassa margem, é bem verdade, o setor mentalmente saudável da população brasileira o impediu de se reeleger no dia 30 de outubro e esta vontade está legitimamente expressa nas urnas.

O fascismo doentio, anti-prazer e anti-vida foi derrotado e não tem mais volta.

Admitam a verdade e voltem para casa a fim de lamentar, com oceanos de lágrimas, a desgraça do "mito" assassino. 

Seu calvário nem iniciou ainda e o sangue de cada brasileiro desnecessariamente falecido nos braços do Covid só será devidamente honrado quando este monstro for condenado a pagar seus crimes na masmorra pelo resto de sua ignóbil vida!

Ubirajara Passos

Ação judicial da coligação de Bolsonaro visando anular os votos de 40% das urnas e declará-lo eleito é o coroamento de manifestações aparentemente ingênuas, tresloucadas e inócuas. Urge ao povo ocupar as ruas ou o golpe se tornará uma cruel realidade.


Diante da representação apresentada ao TSE hoje alegando sérios problemas em 40% das urnas utilizadas no segundo turno das eleições presidenciais (ver notícia clicando no link aqui), cujo caráter tecnológico pretensamente antiquado comprometeria a fidedigna expressão da vontade do eleitorado, se torna explícito que o golpismo verbal dos bolsonaristas pós-30 de outubro não é mera reina furibunda sem maiores consequências. Nem o profundo silêncio de seu mito mentecapto.

O golpe está a caminho. Estruturado juridicamente e não apenas alicerçado nas manifestações do que parece, aos olhos ingênuos da maioria, um rebanho demente de fanáticos folclóricos e tresloucados.

Começaram trancando rodovias. Não houve a devida reação legal das autoridades responsáveis.

A seguir foram para a frente dos quartéis bradar e desfilar Brasil afora. O caráter histérico e estrambótico dos protestos bolsonazistas que pregavam de forma escancarada (em flagrante delito de crimes qualificados no próprio Código Penal) o rompimento da ordem jurídica constitucional e democrático não sofreu sequer a reprimenda de de um mero boletim de ocorrência e a reação da maioria dos militantes populares foi de riso e desconsideração diante do que se considerava apenas um bando de fascistas inconsequentes, cuja manifestações hidrofóbas se dissipariam no cansaço do tempo sem maiores repercussões.

A maior parte das organizações partidárias de esquerda e organizações da classe trabalhadora, tranquilizadas pela ideia de que não há clima institucional para qualquer golpe, mantiveram-se silentes, crentes que qualquer reação pública à altura das ações golpistas poderia dar pretexto a um clima de exasperação almejado pelas provocações bolsonaristas e o melhor remédio contra elas seria a indiferença.

Somente alguns poucos movimentos e organizações sindicais e partidárias populares, cientes de que não se trata de mero “mi-mi-mi” de perdedores inconformados e inofensivos, saíram às ruas para protestar contra a incitação expressa ao golpe militar manifestada (e exigir a revogação das reformas trabalhista e previdenciária que foram o principal objetivo da derrubada de Dilma, a prisão de Lula e o apoio à eleição de Bolsonaro), como as mil pessoas que marcharam na Borges de Medeiros, na tardinha de quinta-feira passada em Porto Alegre.

E agora, hoje, depois de semanas de silêncio do líder mentecapto, e muito barulho de seus adeptos, temos o coroamento do que se julgava um mero desabafo tresloucado de perdedores surtados. A contestação à eleição de Lula, e à retomada do processos democrático no Brasil, toma as cores concretas e perigosas de uma representação jurídica perante o Tribunal Superior Eleitoral, visando, com argumentos técnicos duvidosos, anular o resultado de 40% das urnas utilizados e reconhecer a pretensa vitória da candidatura do nazista genocida Jair Bolsonaro à Presidência da República.

Ainda que seja rechaçada pelo TSE e pela suprema corte de justiça do país, a ação e seus argumentos servirão de pretexto não só para os protestos aparentemente inócuos, que já incluíram a tentativa malograda de uma greve geral de patrões, mas para eventuais ações de força concretas do aparato militar, que estariam sendo tramadas a boca pequena nas casernas, segundo membro do Tribunal de Contas da União, conforme áudio vazado nesta semana, e recebido sem a devida importância.

Se não houver a devida ação necessária do judiciário, com a prisão e processamento de todos envolvidos nas manifestações pró-golpe, na forma legal, estará se incrementado de forma perigosa, e talvez inevitável, o desfecho de uma quartelada, eventualmente apoiada por setores do grande capital, que começa a inquietar-se no setor da especulação financeira e acionária, assustado com meras declarações do presidente eleito a respeito da prioridade das necessidades sociais do povo brasileiro frente à austeridade tacanha da “responsabilidade fiscal”.

Mas não podemos esperar pela mera reação institucional das autoridades. Mais do que nunca se faz necessário que a massa trabalhadora, a que sustenta os privilégios inomináveis dos patrões das altas cúpulas, e faz andar o Brasil, ocupe as ruas para evitar o golpe e dar sustentação ao novo governo (inclusive exigir deste o mínimo de compromisso com as multidões que tiveram retirados na marra seus direitos trabalhistas e previdenciários pelo processo golpista inaugurado em 2016).

Ou poderemos assistir até o fim do ano, calados e estupefatos, a inviabilização da posse de Lula ou uma solução de compromisso e “pacificação” similar a que tentou manietar Jango em setembro de 1961, quando o Movimento da Legalidade tornou inviável o golpe contra sua posse, instaurando um parlamentarismo falcatrua e de ocasião, somente derrotado por um plebiscito popular, em janeiro de 1963. Que não evitou, um ano e dois meses depois, a deposição do último governo efetivamente comprometido com as reformas necessárias à garantia da dignidade popular e a defesa do Brasil contra a espoliação internacional, por um golpe (admirado pelo capitão Jair) que, instalando a mais cruenta ditadura fascista e anti-nacional, nos legou o Brasil da miséria e violência generalizada que ainda hoje vivemos.

Ubirajara Passos

A noite acabou, mas os primeiros raios do sol apenas estão surgindo e é preciso a luta redobrada para que a aurora se complete


Na manhã da última segunda-feira de outubro, há quatro anos, eu trazia a este blog o medo e o nojo profundo que me invadiam diante da vitória do fascismo golpista, incentivada e premeditada pela corja dominante do escravagismo assalariado daqui e d’além-mar, mas terminava a crônica noticiando a minha incorrigível e temerária teimosia em prosseguir batendo na dominação e resistindo, porque simplesmente não sabia viver de outro modo. Citava então o “primeiro poema” que a Isadora, com seus 10 aninhos, havia parido na primeira madrugada do ano, na hora de deitar, me afirmando: “São os nossos sonhos que fazem o sol nascer. Se a gente não dorme, o dia não vem. E as nuvens são os nossos pesadelos.”


Ontem à noite, no auge do entusiasmo dos seus 14 anos, esta mesma menina, divertiu-se, no momento da virada, comemorando a apertada vitória da dignidade humana e da liberdade a enviar vídeos satíricos do tyk tok, esculhambando o nazista defenestrado do Palácio do Planalto, para suas amiguinhas.


E agora pela manhã, passada a euforia da vitória absolutamente necessária para a retomada de um mínimo de normalidade, chego à conclusão que não há outro caminho para nós, defensores da vida e da justiça aos que a forjam todo santo dia no suor de um trabalho inglório, do camelô fudido ao funcionário público definitivamente proletarizado (condição na qual me incluo), que não redobrar a heroica resistência destes últimos quatro anos e tomar as ruas não apenas para dar uma corrida vigorosa nas tentativas tresloucadas de reação fascista que começam a se articular numa nova onda de protestos e ocupação de rodovias por camioneiros direitosos  Brasil afora (pedindo intervenção militar em 72 horas), mas para fazer valer o empenho muito além do resgate simbólico da dignidade.


O novo governo só se sustentará, e se sustentando garantirá o seguimento da democracia e o afastamento definitivo da ameaça do totalitarismo truculento, se tiver a seu lado, organizado e militante, o povo na rua, mas este próprio povo não possuirá condições de manter o ânimo se a retomada da luta pela revogação concreta da escravidão abolida em 1888 pela princesa regente da Casa de Bragança restringir-se às declarações formais e ao papel. É urgente e necessário que a mais nefasta obra dos golpistas de 2016, a que realmente justificava a deposição de Dilma, a prisão de Lula e a eleição do ridículo, mas perigosíssimo, capitão do mato histérico seja desfeita e integralmente revogada: a reforma trabalhista e previdenciária.


Chegamos a um momento de enfrentamento em que a maioria parlamentar fascista forjada a nível federal pelo uso da máquina pública pelo Coiso (que ontem, novamente, tentou usá-la no seu desespero, transformando a polícia rodoviária federal em jagunçada a serviço de seus planos continuístas) e o histerismo coordenado de seus adeptos nas ruas necessariamente nos forçarão à reação concreta, pela retomada das marchas de milhões sedentos de dignidade iniciada em 2013, para simplesmente impedir que a noite engula a frágil alvorada que hoje se anuncia. Mas para a peonada ralada deste país de pouco valerá o enfrentamento se este resultar na simples manutenção da ordem democrática, jurídica e formalmente.



E fatalmente a reação ao golpe há de dar um passo além, sob pena de esvair-se, forçando a completude da obra iniciada na teimosia resistência de anos atrás. Para a grande massa da peonada brasileira não será suficiente a purificação dos ares com o banimento do fedor nauseabundo do totalitarismo histérico. É preciso garantir a revogação, no mínimo, de toda a barbaridade cometida contra a classe trabalhadora e a efetiva valorização do salário mínimo, para que este retome, em alguns anos, o pico real recebido no governo de Juscelino Kubitcheck em 1959, que atualizado para hoje é superior ao próprio salário mínimo necessário apurado pelo Dieese, de mais de R$ 6.000,00, pelo protagonismo político mobilizado da massa que sustenta, esquálida e cansada, com seu trabalho, este país.


Passamos por um pesadelo cruel e assassino e não poderemos admitir que (além da justiça necessária, com a condenação de seu líder à prisão perpétua por crime contra a humanidade, na Corte Internacional de Justiça) o sangue de cada trabalhador morto nos braços do Covid-19 em razão do genocídio planejado pela ala mais bandida e tresloucada da voraz burguesia escravagista do Brasil tenha sido em vão. É preciso conquistar, muito além das benesses assistencialistas do passado, a  concreta dignidade para o povo brasileiro, ou a luta, que se mostra ainda mais feroz e encarniçada, não terá valido a pena.

Ubirajara Passos

A última e fatal oportunidade de salvar o Brasil é derrotar Bolsonaro nas urnas amanhã.


Escrevo às vésperas de uma eleição presidencial cujas últimas pesquisas apontam, em sua maioria, uma vitória extremamente apertada de Luís Inácio da Silva, o Lula, sobre o Jairzinho Capitão do Mato. Por menor que seja o alcance, hoje, desta publicação, se ela lograr definir ou alterar o voto de um único brasileiro poderá ter colaborado para a salvação de todos nós, membros da grande massa de escravos assalariados deste país, das garras infernais que envolveram o Brasil desde o fatídico 29 de outubro de 2018, cravando-se fundo em nossos corpos e mentes, até sangrar, e cuja continuidade, fatalmente há de espremer-nos até a última molécula de dignidade humana, numa tortura infinda, até cujo fim multiplicar-se-ão aos milhões as vítimas da morte em vida, transformadas definitivamente em gado enlanguescido a puxar, trôpego, o arado sob a truculência do látego cínico e orgulhosamente cruel de um governo fascista assumido e cretino.

Se há quatro anos a perspectiva da ditadura e da barbárie destroçante de todo traço de um mínimo de vida, liberdade e humanidade que ainda podíamos gozar nas condições precárias da dominação escravagista mal disfarçada sob a qual vivemos, ainda admitia a necessidade de justificar-se o voto no opositor petista de Bolsonaro no segundo turno (o professor Hadad), diante das minhas históricas críticas e contrariedades às práticas dos sucessivos governos petistas, hoje não há a menor dúvida, nem a mais diminuta hesitação possível em garantir a derrota do Messias do Autoritarismo Genocida, digitando-se na urna eletrônica o emblemático número 13 do PT.

Fosse qual fosse o personagem contraposto ao atual Presidente da República e mereceria todo o apoio entusiasmado para garantir que seja decepada a cabeça da monstruosa opressão que sobre nós abateu-se como resultado da hegemonia da peste emocional.

Já não tememos quanto poderá nos desgraçar o futuro, nem precisamos elucubrar sobre os matizes mais diversos das possíveis atrocidades destinadas à massa de trabalhadores miseráveis e diariamente oprimidos pela precariedade de uma vida cada vez mais indigna do sacrifício árduo do trabalho, através do qual se cria o privilégio requintado de nossos sinhozinhos.

Além de todas as barbaridades políticas e sócio-econômicas (como a reforma da previdência que, vinculando a aposentadoria à idade mínima – ainda por cima absurdamente elevada, praticamente a extinguiu, ou a política econômica inflacionária e arrochante dos salários, que transformou ovo ou osso de gado em iguaria refinada no prato da maioria dos brasileiros) já se realizou o crime supremo e indefensável diante do qual é custoso se admitir, sem qualquer perplexidade, que o senhor Jair Messias Bolsonaro ainda continue à frente da presidência da república e disputando sua reeleição.

Cínica e debochadamente realizou-se, sem a menor vacilação, em meio à pandemia que ameaçou a vida humana sobre a Terra, o genocídio conscientemente assumido e premeditado, que conduziu 700 mil brasileiros à cidade dos pés juntos nos braços do coronavírus. Não casualmente, a grande maioria deles pertencente às camadas mais miserabilizadas e indefesas da peonada trabalhadora, que, sem qualquer auxílio econômico que lhe garantisse a possibilidade de permanecer em casa pelo tempo necessário à redução da contaminação e desenvolvimento e aplicação da vacina (como se praticou mesmo nas nações capitalistas mais inveteradas), se viram premidas ao comparecimento diário ao trabalho e ao contágio inevitável e fatal do voraz vírus, que os conduziu à morte agonizante pela falta de ar e falência do organismo (ironizada debochadamente por Bolsonaro em entrevista dedicada a criticar o único ministro que tentou aplicar política sanitária racional e coerente).

matando o drãgão

Bolsonaro não combateu o isolamento social, o uso da máscara de proteção, nem retardou ao máximo possível a aquisição e distribuição da vacina anti-covid por mera incompetência e ignorância. O fez de caso pensado, preocupado na preservação dos lucros do punhado de bilionários nacionais e do grande capital internacional a cujo serviço foi eleito. Mas não o fez com o menor escrúpulo. Porque para ele, assim como para a alta rafuagem mencionada, a horda de trabalhadores consumida pela voracidade do covid-19 não possuía a menor importância e, como ralé, gentinha inútil e destituída de humanidade, não faria qualquer falta, visto que mera ferramenta anônima e substituível na geração dos bens necessários ao mercado.

Enquanto um Zé Ninguém qualquer tombasse, sem a menor chance de sobrevivência, vítima da doença do século, havia pencas de companheiros da mesma condição, esperando ansiosamente à porta dos estabelecimentos por um emprego que lhe garantisse qualquer renda e não haveria porque preocupar-se em resguardar a sobrevivência destes burros de carga bípedes excedentes, criando complicações desnecessárias ao andamento dos negócios e ameaçando a continuidade das atividades econômicas por tão desprezíveis seres, medíocres e indiferenciados como uma massa de vermes.

Era ate útil o morticínio resultante da falta de combate efetivo à pandemia, pois assim poderia se limpar a impoluta e educada sociedade destas criaturas precárias e encrenqueiras, sem qualquer força de vontade e espírito de empreendedorismo, cuja miséria material e mental tendia a torná-los irascíveis e rebeldes à sacrossanta ordem burguesa, empesteando-a com a eventual derivação para o crime, a drogadição, a marginalidade…

Antes que qualquer fanático adepto do Capitão Jair comece a entoar seus histéricos protestos contra o cenário acima descrito, é preciso, é claro, que se diga o óbvio. Não, não tive acesso a nenhum documento secreto, “prova concreta e irrefutável” (como bradaria um tresloucado bolsomínion diante da leitura desta crônica), nem a narrativas privilegiadas de alguma testemunha ocular de reunião na qual se tenha discutido as tais medidas sob os argumentos descritos. Mas nada disto é preciso. Basta examinar-se as atitudes e falas concretas do Messias miliciano, seus puxa-sacos e admiradores, para se constatar os motivos ocultos descritos, diante do cinismo psicopático de quem exigia que não se fizesse isolamento social para não quebrar a economia nacional, afinal o Coronavírus era apenas uma gripezinha. Ou depois, frente às primeiras mortes, com a desfaçatez e frieza própria dos grandes tiranos nazistas e genocidas, respondia solenemente que não era coveiro, quando questionado quanto à inação do governo federal diante do avanço catastrófico do covid, que em capitais como Manaus levava ao enterro em valas comuns, tamanho o número e frequência das mortes, que não permitiam a abertura a tempo e com dignidade dos túmulos necessários.

“Se quisesse” o atual governo federal poderia ter lançado mão dos recursos econômicos e administrativos necessários ao combate eficaz da pandemia, numa política sanitária pautada pela prevenção e conhecimento científico. Mas não o fez porque não podia perder a ocasião de fazer uma limpeza útil e necessária, a seu ver, na bagaceirada pobre que empesteia o Brasil cristão operoso e sério. Bastava criar os meios de prover os recursos necessários para viabilizar o isolamento social na fase inicial (o que poderia, tranquilamente, se fazer por uma taxação pífia, que mal arranharia as grandes fortunas) e conduzir seriamente as negociações para aquisição e distribuição a tempo das primeiras vacinas desenvolvidas e a grande maioria das mortes não ocorreria. Sua existência não era inevitável, desde que adotada uma política sanitária humana e coerente.

Cada ente querido de cada família deste país, de norte a sul, que morreu infectado pelo infeliz vírus, foi sacrificado, portanto, desnecessariamente e seu sangue, derramado inutilmente, clama a cada um de nós que façamos pelo voto o que o oportunismo tacanho e elitista das lideranças políticas em geral não o fez pelo caminho legal e lógico do impeachment. O afastamento do monstruoso ser que atende no Palácio do Planalto pelo nome de Jair Messias, ocupando ilegitimamente, como perfeito assassino em série, de punhos brancos e imaculados, mas infecta e venenosa saliva, a Presidência da República. Este não é o seu lugar, mas o assento na cadeira como réu de crime contra a humanidade, na Corte Internacional de Direitos Humanos e a posterior condenação à masmorra na prisão perpétua como punição por suas atrocidades.

Pouco importam, portanto, as virtudes ou precariedades de seu opositor. Nem o maior traidor político pelego ou o mais servil detentor de cargo público neo-liberal privatizador do patrimônio nacional chegam aos pés do crime cometido pelo moderno feitor de escravos Jair Messias Bolsonaro.

Amanhã é a ocasião derradeira. Ou decepamos, com a força do voto, a cabeça monstruosa que comanda o modernoso nazismo brasileiro, ou terá sido enterrada de vez a perspectiva de qualquer resgate mínimo de solidariedade e dignidade humana neste país infestado pela truculência dissimulada e cínica do terrorismo de Estado, que já não se manifesta explicitamente na tortura ou na pancadaria, mas se faz na condução da política social e econômica, tendo por ferramenta incentivadora o poder peçonhento da palavra falso-moralista, intrigueira e distorcedora da realidade, grávida do recalque do sado-masoquismo oculto e (nem tanto) reprimido.

Ubirajara Passos

Bolsonaro é a manifestação arquetípica deturpada de Macunaíma


No imaginário de boa parte de seus seguidores Bolsonaro é a expressão (espúria) da rebeldia irreverente do brasileiro comum ao pedantismo opressivo do representante politico clássico e institucional da ordem oligarquica.

Isolado dos demais e incapaz de se rebelar de forma a derrogar a ordem escravocrata em que vive (justamente por seu isolamento, que herda do individualismo atávico do índio), o trabalhador historicamente estruturou seus meios de sobreviver à opressão por uma resistência passiva, adaptando-se à ordem pela transgressão clandestina à disciplina rígida e soberba do feitor e do sinhozinho. É a fruta ou o biscoito que se furta sub repticiamente para matar a fome que a ração fornecida pelo amo não satisfaz ou a esperteza, o engodo na transação de um negócio, venda ou trabalho qualquer contratado com o coroné a única forma do peão desprovido de qualquer direito, que se vê nulo e impotente diante do domínio absoluto e incontestável dos senhores, de burlar precariamente a indigência material e social em que vive.

Não por acaso Macunaíma é o arquétipo literário da mentalidade profunda do Brasil. Se o índigena, acostumado a prover autonomamente a própria vida, sem receber ordens nem prestar contas a quem quer seja (até por dominar todas as técnicas necessárias à sua sobrevivência adaptada à natureza), uma vez escravizado pela força do mando armado e disciplinador, não vê muitas vezes outra saída que o suicídio (assim como o negro trazido à força da África deixava-se morrer lentamente, no banzo), seus futuros descendentes mestiços de corpo e alma desenvolverão a rebeldia individualista disssimulada à opressão disciplinadora e moralista (de uma falsa moral que intuitivamente identifica), que o faz desprezar não somente o doutor empolado, cheio de ademanes que (sob o pretexto do progresso ou bem maior de uma abstrata nação) executa, com a força das leis que impõe ou cumpre, a vontade dos “donos” da grande senzala brasileira, mas também o caricato “revolucionário”, cartilhesco e cheio de éticas e disciplinas, que quer lhe tolher o menor deboche irreverente (que faz parte de sua estratégia em sobreviver suportando a opressão) como expressão do “preconceito” pecaminoso e intolerável contra segmentos sociais oprimidos. 

Levado ao auge da exaustão e da miséria, o grosso do povo brasileiro, exausto da hipocrisia edulcorada do patriciado político (que odeia por intuir que as filigranas falazes de complexidade de um discurso oco e estéril escondem tão somente a voracidade insaciável do senhorio que lhe destroça a vida na lide extenuante e miseravelmente remunerada) se atira sofregamente ao primeiro salvador da pátria cujos modos informais e desbocados parecem incorporar o próprio espírito de simplicidade contrafeito à pompa prepotente da casa grande. Assim surgem os Jânios Quadros que param o discurso para tirar uma banana do bolso do paletó e traçá-la e os Bolsonaros que disparam palavrões e xingamentos desconexos ao que aparentemente é a política burocrática, inóqua e ossificante da vida praticada pelas elites.

O fascismo não é somente a expressão política da peste emocional, do autoritarismo voluntarioso, raivoso e anti-prazer que constitui a outra face da mentalidade deste mesmo povo submetido, e integrado voluntariamente de certa forma, à disciplina patriarcal tradicional que informa inconscientemente a dominação social. Ele se alimenta também da incapacidade da esquerda (eivada da disciplina impositiva e dogmática de um programa revolucionário similar, na cômica seriedade rígida, às atitudes “patrióticas” ou apologéticas de progresso do político conservador) em entender e se aproximar da mentalidade hedonista e libertária (ainda que abastarda pela distorção do domínio impositivo) do “povão”, se perdendo nas discussões teóricas abstratas inquestionáveis no caso de uma Alemanha pré-Hitler e na asfixia da patrulha identitária que busca em cada esquina um transgressor verbal do bom mocismo convertido em filosofia política, no caso do Brasil.

Se a Alemanha, impregnada em seu inconsciente coletivo pela dedicação estoica ao trabalho própria de seu imaginário profundo, deixou-se possuir pelo arquétipo de Wotan, o deus nórdico da Guerra, e pariu o nazismo racista e imperalista, o Brasil, cevado num hedonismo epicurista espontâneo, grávido do prazer de bem viver, livre, informal e sereno do índio, reprimido e pisoteado por séculos pelo tacão dos senhores pretensos donos da terra e de nossas vidas, incorporou Macunaíma e pariu o bolsonarismo, que é o fascismo tingido de deboche e informalidade, o qual encanta e fanatiza os incautos justamente por aproximar sua linguagem da revolta do cidadão comum a uma atitude artificiosa e ostentatória própria da mentalidade do opressor.

Assim, dificilmente sairemos do abismo genocida e sufocante de qualquer manifestação real de vida em que mergulhamos (muitos crendo, inconsciente e paradoxalmente, estar defendendo esta mesma vida, espontânea e imbuída de prazer), ao menos que os verdadeiros revolucionários, comprometidos e identificados com os interesses e sofrimentos da peonada, se despojem de suas plumas intelectualóides e professorais e, descendo do pedestal (como já ocorreu nos tempos do Comando Geral dos Trabalhadores, do CPC da UNE e da frente de Mobilização Popular, nos idos do pré-1964), sentem ao rés do chão juntamente com o povo que anseia não apenas por um existência decente, por comida na mesa e um sapato confortável, mas por uma vida em que possa manifestar e expandir a alegria sem frescuras e isenta do ranço autoritário e disciplinador do “bom comportamento” sisudo e cheio de etiquetas e das preocupações com a compostura e os “compromissos” que informa a velha “ética” anti-prazer e pró-sofrimento do Ocidente cristão e de todas as sociedades estruturadas no trabalho compulsório e servil da grande maioria em prol dos restritos prazeres e interesses de uma minoria dominante.

Ou resgatamos a profundidade das matrizes indígenas e africanas, que, sufocadas e transformadas em sombra psíquica pela mentalidade de trabalho austero e heterônimo, se manifestam na forma da adoração ao fascismo mambembe, ou prosseguiremos séculos afora, nas palavras de Darcy Ribeiro, como um grande moinho de gastar gente pra adoçar a boca de europeu.

Ubirajara Passos

O genocida Jair Bolsonaro não é incompetente. Sabe muito bem o que está fazendo e já ultrapassou faz tempo sua meta de executar 30 mil brasileiros


Diante de “dúvidas”, como a de um senador da CPI da pandemia, nesta manhã, que queria esclarecer se o Jairzinho Capitão do Mato havia adotado a insustentável e falaz tese “médica” de que o covid-19 poderia ser erradicado através da chamada “imunidade de rebanho”, mediante o contágio de mais de 70% da população nacional (o que justificaria suas atitudes de pouco caso com a máscara e oposição ao isolamento social) é preciso, novamente, que se diga a mais pueril e óbvia das verdades.

Bolsonaro não é incompetente, muito pelo contrário. É pública e notória a situação mundial da pandemia, bem como as medidas que foram adotadas pelo mundo afora para combatê-la e a posição de Bolsonaro (espelhada em Trump, que levou mais de meio milhão de americanos à morte) não pode ser creditada à ignorância ou incapacidade de gerir a crise sanitária. SUA POSTURA PERANTE O “CORONA” NO BRASIL É PROPOSITAL.

Talvez não porque queira fazer uma limpeza social no Brasil (já que a grande maioria das vítimas, seja pela carência econômica, seja por se encontrar entre a classe trabalhadora, se vê obrigada a enfrentar diariamente o vírus nos ônibus e empresas – pela exigência patronal homologada nas flexibilizações governamentais irresponsáveis), sobre o que pairam dúvidas, dado seu pendor nazista.

Mas uma coisa é certa: ele coloca os interesses do grande capital internacional e local associados (bilionários e bancos) ACIMA DA VIDA DA MASSA DOS BRASILEIROS, E PARA NÃO TOCAR NOS PRIVILÉGIOS DESTA ELITE INFECUNDA E VORAZ (CUJA TRIBUTAÇÃO DARIA CONDIÇÕES DE PAGAR UM AUXÍLIO DECENTE PARA O GROSSO DA POPULAÇÃO, INCLUSIVE PEQUENOS E MÉDIOS EMPRESÁRIOS) NÃO COMANDA E ATRAPALHA O DISTANCIAMENTO SOCIAL, necessário mesmo com a vacinação, que não impede de todo a infecção por um vírus que quando não mata deixa sequelas gravíssimas).

A “incompetência”, quem sabe, poderia ser caracterizada na falta de empenho registrada desde o ano passado na aquisição, distribuição e produção nacional da vacina. MAS NESTE CASO O QUE EXISTE MESMO É A MÁ VONTADE DE UM LÍDER POLÍTICO ADEPTO DO MODUS OPERANDI E DA IDEOLOGIA QUE INFORMAVA A DITADURA MILITAR ENTREGUISTA INAUGURADA EM 1964, PARA O QUAL O POVO TRABALHADOR, O POVÃO VALE TÃO SOMENTE COMO MÃO DE OBRA SEMI-ESCRAVA, DESTINADA À GERAÇÃO DOS ALTOS PRIVILÉGIOS.

Ubirajara Passos

4 verdades sobre a natureza política e social do morticínio no Brasil e os sócios do “Corona”


1.ª:

Diante das novas investidas absurdas para reabrir até escolas no auge da pandemia é preciso que se diga: o fato é que ninguém deveria estar trabalhando em plena bandeira preta (altíssimo risco no Rio Grande do Sul) e ponto.

Esta insistência em querer reabrir tudo, do comércio às escolas é insana e só posterga indefinidamente a pandemia. Foi ela que causou a situação crítica atual e os mais de 400 mil mortos no Brasil. Não fosse a supremacia tacanha do capital, a situação hoje seria outra, muito embora continuasse dependente da vacinação em massa. O assassinato institucionalizado da irresponsabilidade deliberada neste país converteu o Brasil em criadouro para manter a pandemia global.

E a cada reabertura tresloucada se alimenta mais a desgraça vigente em todo o mundo. Bolsonaro, embora seja o grande responsável, tem cúmplices em cada “autoridade” que pratica atos de flexibilização e em cada setor que os exige ou não combate a situação sanitária vigente. São todos igualmente assassinos e, diante do pleno conhecimento das características da doença e da evolução do seu contágio, não podem invocar a atenuante da ignorância ou da incerteza sobre os fatos.

2.ª:

Bolsonaro gera o processo genocida somente ao se opor ao isolamento social e marcar passo na questão da vacina?

NÃO! É AO NEGAR UM UM AUXÍLIO DECENTE PARA TODOS OS TRABALHADORES, PROFISSIONAIS LIBERAIS, AUTÔNOMOS, PEQUENOS E MÉDIOS EMPRESÁRIOS, PRINCIPALMENTE, QUE ELE CRIA O CENÁRIO QUE LEVA AO ROMPIMENTO DO ISOLAMENTO E AO INCREMENTO DO CONTÁGIO.


Sem auxílio o pequeno e o médio empresário, cegados pela natural instabilidade de seus negócios se aliam ao grande capital (que não precisa de auxílio e só quer preservar os lucros milionários, pouco se lixando para as camadas sociais inferiores) e vão todos pressionar governadores e prefeitos para manter seus negócios abertos, bem como coagir a peonada a trabalhar presencialmente, sob ameaça de demissão.

Os pequenos e médios também são vítimas na necropolítica, mas, ao pressionarem pela reabertura e não pelo auxílio, se tornam tão assassinos quanto Bolsonaro, bancos, empresas estrangeiras e bilionários.

3.ª:

Por trás das atitudes do Jairzinho Capitão do mato estão não apenas os pendores nazistas de seus seguidores histéricos e imbecis e o interesse dos setores explicitamente criminosos (embora nunca criminalizados) que se constituíram em sua base eleitoral, como milicianos, mineradores ilegais e estelionatários espirituais, mas principalmente a fome voraz e inextinguível do grande capital estrangeiro e seus associados da burguesia local (bancos e bilionários). Que não admitem ceder um único centavo de seus privilégios (obtidos pela exploração do gado humano cujo trabalho mantém o Brasil andando) para a sobrevivência do restante da população, que para eles não passa de ralé nascida para lhes servir, não lhes fazendo a menor diferença se um punhado de alguns milhões morrer nos braços do Corona, enquanto houver escravos assalariados o suficiente para garantir o luxo de suas mansões, em cujo interior se encontram protegidos da pandemia global.

É a estes senhores que serve a presidência da república, e por isto não pretende criar os meios tributários para garantir a concessão de uma renda decente para a grande maioria dos brasileiros, por conta do Estado, enquanto durar a pandemia, possibilitando o pleno afastamento do trabalho (e consequentemente do contágio) a todos aqueles cuja atividade não seja essencialíssima à continuidade do abastecimento, à segurança e à própria saúde pública.

Para o executor dos interesses maiores da meia dúzia que comanda a sociedade brasileira e retém o grosso da renda e das riquezas em suas mãos, tributá-la (como feito mesmo nas maiores potências capitalistas) é simplesmente uma heresia e não há mortandade que o justifique.

4.ª:

As mais de 400 mil mortes por covid-19 registradas no Brasil desde o ano passado não são, portanto, responsabilidade exclusiva do “Corona”, mas o resultado sócio-econômico de uma política genocida que evitou adotar as medidas sanitárias imprescindíveis ao seu combate, da ausência do distanciamento social efetivo, continuamente “flexibilizado” pela irresponsabilidade homicida de prefeitos e governadores, à má vontade deliberada em providenciar a vacinação célere e massiva, e à negativa da concessão de auxílio emergencial decente para o grosso da população. O que foi feito conscientemente em nome dos interesses de uma elite infecunda e escravocrata que está cagando e andando para as mortes entre a classe trabalhadora.

Muito mais do que uma hecatombe sanitária, vivemos, consequentemente, uma guerra civil surda e atroz, cuja solução já não envolve tão somente o afastamento de seu líder institucional no executivo federal, mas a resistência e a desobediência civil da peonada diante dos atos de abertura de estabelecimentos privados, escolas e serviços públicos e das flexibilizações praticados por cada gestor público sócio de Bolsonaro e do covid-19.

Como em qualquer rebelião, entretanto, a sua eficácia inicia pela conscientização individual de cada peão cuja vida se vê ameaçada, e muitas vezes se vê incapaz de reagir, não apenas pelo medo da perda do emprego, mas por não conseguir enxergar, em consequência do bombardeio midiático e político, e da hiponose ideológica imposta desde sempre, efetivamente a realidade, atirando-se voluntariamente (até pela vocação servil introjetada geração após geração) nos braços do vírus letal!

Ubirajara Passos