Erosão


Soneto empolado, xaroposo e filosofante que pari debaixo do chuveiro há uma meia hora, que vai publicado para qualificar o prazer masoquista da melancolia de algum leitor insone e entediado:

Erosão

Tempo, tu és um salteador rebelde.
Não te limitas às raras alegrias
E aos prazeres e entusiasmos fugidios.

Nos arrebatas épocas inteiras
De ingênua e inciente plenitude
E, num ir e vir variável, mas contínuo,
Corróis grandes tristezas e euforias.

Tu dissolves
Nossos picos e vales,
Florestas e desertos.

Aplainas rochas,
Incendeias astros,
E nos transmutas num inerme prado
De imutável e marmórea eternidade.

Gravataí, 17 de maio de 2011

Ubirajara Passos

Auto-análise


Poema que acabo de parir, ao som de uma antologia de Nat King Cole, banhada por um martelo de conhaque:

Auto-Análise

Uma tristeza antiga,
Doída como a madrugada
Insone e eterna, de silêncio absoluto,
Se insinuava na fumaça azul,
De um antigo perfume adocicado,

E nos fazia navegar no escuro,
Salpicado de raios esquivos,
Da velha janela da sala de estar,
Sobre um tapete pesado e rabujento.

No jardim sujo, uma brisa amarrotada
Arrepiava os nossos pensamentos
E enfronhava, no olhar turvo
De um conhaque de garrafa verde escura,
Memórias roucas e toques crepitantes.

Sobre a mesa de centro envernizada
Um cinzeiro de vidro bancava o analista.

Gravataí, 10 de maio de 2011

Ubirajara Passos